Outro dia fui impactada por um vídeo maravilhoso no Instagram que mostrava as respostas de crianças e adultos à seguinte pergunta: "Se você pudesse, o que mudaria no seu corpo?". As respostas dos adultos versaram sobre calvície, rugas e altura. Já as crianças, em toda sua genialidade, deram respostas como "Não mudaria nada, gosto do meu corpo assim" e a minha preferida: "Gostaria de ter uma cauda de sereia!".
É impressionante como a gente vai se limitando ao longo da vida, né? Não quero bancar a louca hippie, mas é inegável que fechamos portas desnecessariamente...
O ano era 1992, e me lembro de fazer um desenho na escola sobre o tema "o que você quer ser quando crescer". Dividi a página na diagonal e na esquerda desenhei um sol, uma cruz, uma pessoa deitada e um carro com um farol vermelho no teto. No triângulo da direita desenhei uma lua, um bando de estrelas, cometas, uma nave espacial e um bonequinho que, com sua armadura, visitaria o espaço na minha imaginação. Não é óbvio, e totalmente factível? Seria médica de dia e astronauta à noite. Nem precisava de cauda de sereia para isso...Porque, aí sim, haveria uma dificuldade.
Corta a cena para os anos 2000 e, qualquer um que me acompanhou academicamente, sabe que Física sempre foi o calcanhar de Aquiles. Não houve professor do Ph que conseguisse me fazer absorver mais do que as três leis de Newton. E vamos combinar que uma carreira de estudos aeroespaciais fica meio comprometida com esse gap de skills.
Nessa mesma época, a boa memória que sempre me acompanhou seguia favorecendo, inclusive para decorar a reprodução das briófitas em Biologia ou as regras dos anéis aromáticos em Química. Mas, a latente hipocondria já me afastava com grande velocidade de uma carreira médica.
Nunca me frustrei. Amém. Mas essa lembrança viva de que realmente queria ser médica e astronauta vira e mexe volta. Principalmente quando estou brincando com meus sobrinhos. Hoje, um deles quer ser jogador de futebol, dançarino, desenhista e ter um canal de 1M de inscritos no Youtube. O outro, por enquanto, só quer ser igual ao irmão mais velho. Vamos conversar em 20 anos. Porque, afinal, para onde vamos quando crescemos, né?
Essa semana, peguei um carro de aplicativo voltando de um dia lotado do trabalho. Era sexta-feira, fechando uma semana incrível de aprendizado, reuniões e, felizmente, muito prazer com o que faço. Estava cansada, meio alheia ao caminho que o carro fazia e, só me dei conta de que já chegávamos ao destino, quando o motorista me despertou do meu devaneio perguntando: "Você trabalha na NASA?", respondi que não. Mas um orgulho absurdo, meio infundado, me acometeu - e eu não soube direito o porquê imediatamente.
De fato, àquela hora da noite, só havia dois lugares para ir naquele quarteirão. Saltei do carro, olhei pro outro lado da rua, e ali estava a NASA. Entendi de supetão a felicidade que sentia. Durante aquela corrida de carro, mais alguém no mundo acreditou que eu podia ser astronauta.
A criança que habita em mim sorriu largo. Celebrei que tenha tanta gente que manja de física e admirei a Lua - que sorria de volta. Entrei no hotel com a bolsa mais pesada: resolvi carregar minha cauda de sereia just in case.